Spin-off de startup apoiada pelo PIPE-FAPESP desenvolve tecnologia baseada em inteligência artificial para criar produtos de beleza individualizados (divulgação: ColoriZe)

Dispositivo avalia tonalidade de pele para criar bases faciais personalizadas

07 de outubro de 2025

Roseli Andrion | Pesquisa para Inovação – Muita gente já saiu de casa achando que a maquiagem estava perfeita, mas ao chegar ao destino percebeu que ela não combinava com seu tom de pele. Ou pior: gastou dinheiro em um produto que parecia ideal na loja, mas em casa descobriu que ele era artificial. Esse drama pode estar com os dias contados graças a uma inovação tecnológica 100% brasileira.

A ColoriZe, spin-off da empresa de tecnologia Autaza, apoiada pelo Programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE) da FAPESP, criou um equipamento que usa inteligência artificial para avaliar a tonalidade da pele de forma precisa e criar receitas personalizadas de cor para produtos de beleza. O sistema, que em breve estará em uso em parceria com uma grande indústria de cosméticos brasileira, visa transformar a experiência de compra de cosméticos. “O consumidor vai encontrar a base no portfólio de forma mais coerente”, explica Leonardo Marangon, diretor de tecnologia e operações da Autaza-ColoriZe.

O equipamento funciona de maneira similar às máquinas de tinta disponíveis em lojas de material de construção, que misturam pigmentos na tinta branca para criar as cores do catálogo. “Há, porém, diferença na precisão e na sofisticação tecnológica”, diz Marangon. “Nosso equipamento tem precisão significativamente maior: as máquinas de tinta têm margem de erro muito superior ao sistema da ColoriZe, o que nos garante repetibilidade e reprodutibilidade muito superiores”, compara.

E não é só isso. Enquanto sistemas convencionais usam o padrão RGB (que combina as cores vermelho, verde e azul), a tecnologia da ColoriZe adota o sistema CIELAB, que oferece gama mais ampla de tonalidades de cor. “Com ele, é possível capturar nuances que outros sistemas não conseguem detectar”, detalha.

Do conceito à realidade

Apesar de estar hoje voltada para o mercado de beleza, a ColoriZe começou longe desse segmento: a Autaza, empresa-mãe do projeto, desenvolve sistemas de inspeção de qualidade com uso de inteligência artificial, em especial para a indústria automotiva. O sistema original detecta defeitos na pintura de carros com deflectometria — uma técnica em que imagens são projetadas sobre superfícies para a identificação de variações que podem indicar problemas (leia mais em https://pesquisaparainovacao.fapesp.br/820).

Marangon lembra que, na indústria automotiva, diferentes partes do veículo são montadas em linhas de produção distintas. “Depois, elas são unidas no mesmo carro e as tonalidades de cor têm de ser as mesmas.” Assim, a empresa aprimorou a expertise em análise colorimétrica a partir dessa necessidade de coincidência de cores entre diferentes peças de automóveis na linha de montagem.

Depois, a tecnologia passou a ser aplicada em outros setores. A empresa atuou na indústria de produção de tintas, na área aeronáutica e explorou até mesmo aplicações na área de saúde, com soluções para a odontologia estética. “Chegamos a criar tonalidades para facetas dentais, mas encontramos barreiras regulatórias porque o equipamento deve ser homologado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária [Anvisa].”

Essa aproximação com aplicações em saúde e estética, então, naturalmente levou a equipe ao mercado de beleza. “A transição fez todo o sentido porque ambos os setores lidam com correções estéticas e personalização de produtos.”

Parceria estratégica

A escolha da primeira grande parceira da ColoriZe no setor de beleza não foi por acaso: Marangon destaca que a empresa é aberta à inovação tecnológica. “Ela foi importante para nós como exemplo brasileiro, mas já atua no mundo todo: Europa, México, América do Norte e outros. Isso nos abre portas para mercados globais.”

Na prática, o processo é surpreendentemente simples para o usuário final. Primeiramente, o equipamento identifica a tonalidade da pele com sensores e inteligência artificial. Em seguida, indica o produto do portfólio da empresa mais adequado para aquele tom específico.

Uma outra modalidade de uso do sistema é ainda mais revolucionária: ela cria uma receita personalizada para ser produzida especificamente para o cliente. “Vai ser como ir a uma farmácia de manipulação: após a detecção do tom da pele, o cliente pode retirar o produto personalizado em algumas horas”, explica Marangon. Além disso, as informações ficam armazenadas e o produto pode ser solicitado em qualquer loja da rede, mesmo em diferentes partes do país.

Tonalidades específicas

A ColoriZe é uma inovação brasileira, mas a dificuldade com tonalidades de base é global. “No mercado de beleza, a tonalidade de pele é um desafio sério, principalmente em tons mais escuros, que são mais difíceis de reproduzir.” E isso é ainda pior quando se consideram variações de iluminação: uma base que parece perfeita sob a luz do salão de beleza, por exemplo, pode se mostrar artificial sob a iluminação de um evento. “Nosso sistema pode criar receitas de cor que consideram essas variações de luz.”

Por isso, o foco inicial da empresa são as bases faciais — consideradas parte central da maquiagem e maior fonte de reclamações dos consumidores. Apesar disso, os planos são ambiciosos: a intenção é expandir para outros produtos como sombras e batons, de forma a criar até possibilidades de harmonização entre diferentes itens. “Por que não combinar o tom do batom com o do vestido? Ou o tom da sombra com o do batom? Esses arranjos também são possibilidades interessantes para o futuro”, projeta Marangon.

Embora a tecnologia seja sofisticada, a empresa não quer restringi-la: o objetivo é que o equipamento seja acessível para as revendedoras e consultoras de beleza. “Elas são o maior público das marcas e podem ter um equipamento da ColoriZe na mão para detectar os tons de pele dos clientes”, defende Marangon. Essa estratégia vai permitir que, ao ampliar a base de usuários da tecnologia, a ColoriZe aumente a escala de produção e reduza custos, em um ciclo virtuoso de acessibilidade.

Novo paradigma

No setor de beleza, historicamente, é comum os consumidores comprarem múltiplos produtos até encontrar o tom ideal. Com a precisão da inteligência artificial, entretanto, o segmento pode ganhar eficiência e satisfação. “A tecnologia da ColoriZe pode ir além da conveniência e representar autoestima e bem-estar para quem depende da maquiagem para se sentir confiante.”

Marangon destaca a velocidade do desenvolvimento da tecnologia: todo o projeto, da concepção à comercialização, teve duração de pouco mais de um ano e meio. “Foi muito rápido, muito dinâmico”, destaca. Para o futuro, as expectativas são otimistas: a empresa planeja expansão significativa até 2027. “Estamos começando a nos preparar principalmente para avançar globalmente e aumentar nosso portfólio no mercado de beleza”, antecipa.

A equipe de jovens técnicos que atua no projeto é liderada pelos cofundadores Enivaldo Amaral, que é o diretor técnico da empresa, e Renan Padovani, o CEO. “Por todo esse dinamismo e foco em inovação, falamos que a Autaza é uma empresa de tecnologia, mas ainda tem alma de startup.”