Pesquisadores do CeMEAI criam ferramentas computacionais para o Tribunal de Contas de São Paulo

30 de agosto de 2022

Com a intenção de apoiar atividades de fiscalização, controle e tomadas de decisão, pesquisadores do Centro de Ciências Matemáticas Aplicadas à Indústria (CeMEAI), um dos Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPIDs) da FAPESP, estão desenvolvendo modelos matemáticos e criando ferramentas computacionais para o Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCESP).

Um acordo de cooperação acadêmica com o Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação (ICMC) da USP, instituição-sede do CeMEAI, foi assinado no dia 24 de agosto, em uma cerimônia na reitoria da Universidade de São Paulo (USP).

O presidente do TCESP, Dimas Ramalho, o reitor da USP, Carlos Gilberto Carlotti Junior, o diretor do ICMC, André Carlos Ponce de Leon Ferreira de Carvalho, e o diretor do CeMEAI, José Alberto Cuminato, assinaram o documento que oficializa a parceria para o desenvolvimento de soluções utilizando inteligência artificial para três grandes áreas da prestação de serviços do TCESP.

“A universidade mudou nos últimos anos. Se antes o importante era formar os alunos e produzir ciência, agora a sociedade exige também a inclusão, a orientação na resolução de problemas. Esse tem sido o foco na nossa gestão, tirar a universidade da zona de conforto e estimular novas contribuições para a sociedade”, afirmou o reitor da USP.

Para o presidente do TCESP, “assinar esse convênio, mais do que usar a inteligência artificial, é dizer para a sociedade o quão importante é a USP para o Tribunal de Contas. Nós queremos sempre estar próximos à universidade, porque é o local do conhecimento e da ciência que tem o potencial para nos ajudar a fazer um trabalho cada vez melhor. Estamos juntos, trabalhando pelo progresso de São Paulo e do Brasil”.

“Estamos muito satisfeitos com a oportunidade de mostrar as pesquisas feitas no instituto e que podem colaborar com o Estado de São Paulo”, afirmou o diretor do ICMC, que é também pesquisador principal do CeMEAI.

As tecnologias desenvolvidas

Qual seria o motivo de algum órgão do setor público ter feito compras de destilados ou cigarros? Um dos modelos de aprendizado de máquina em desenvolvimento pelo grupo formado por oito pesquisadores explora grandes bases de dados de notas fiscais eletrônicas e poderia identificar compras consideradas estranhas como essa, dando apoio aos servidores no trabalho de fiscalização.

“Métodos de processamento de linguagem natural [PLN] estão sendo investigados e desenvolvidos especificamente para extrair características e melhorar as informações constantes nas notas fiscais eletrônicas. Essas informações são utilizadas por métodos de aprendizado de máquina para classificar determinados segmentos em textos dos documentos, beneficiando a identificação das mercadorias, bem como o agrupamento de compras similares. Mais precisamente, espera-se identificar riscos relacionados às compras públicas, especialmente sobrepreço. Por fim, técnicas de visualização permitem explorar relações entre empresas, municípios, órgãos públicos e outras entidades envolvidas nos processos de compras descritas nas notas fiscais eletrônicas, facilitando a análise exploratória para detecção de fraudes envolvendo as compras governamentais”, explicou Francisco Louzada Neto, um dos coordenadores do projeto.

O pesquisador Ricardo Marcondes Marcacini complementa que a análise de grandes bases de notas fiscais eletrônicas é uma estratégia utilizada por órgãos de controle para calcular referenciais de preços de vários produtos comercializados com o setor público. “De forma geral, alertas de sobrepreço ou superfaturamento podem ser gerados quando o preço de uma nota é muito discrepante em comparação com outras notas fiscais de um mesmo produto. Por outro lado, esse processo é muito complexo. Em muitos cenários, as informações explícitas existentes nas notas fiscais eletrônicas podem não ser suficientes para determinar quando se trata de um mesmo produto ou serviço. Dessa forma, técnicas avançadas baseadas em inteligência artificial e processamento de linguagem natural são úteis para analisar informações textuais das notas e minimizar esse problema.”

“Nosso método está sendo treinado, por meio de algoritmos de aprendizado de máquina, em um grande volume de notas fiscais eletrônicas para aprender padrões que facilitem identificar quando as notas tratam de um mesmo produto e, assim, calcular preços referenciais e gerar alertas de sobrepreços. Um dos diferenciais em usar tais métodos é que eles podem ser ajustados para notas fiscais eletrônicas de novos produtos, evoluindo conforme a necessidade”, explicou Marcacini.

Avaliação de eficácia escolar

Outra ferramenta computacional em desenvolvimento se concentra na elaboração de modelos de predição e identificação de fatores associados à eficácia escolar dentro da rede municipal de ensino do Estado de São Paulo. “Estamos trabalhando com a criação de modelos hierárquicos para avaliação de eficácia escolar dentro da rede, perseguindo os preceitos da avaliação de políticas públicas com base em evidências e a produção de indicadores de eficácia escolar para as escolas municipais no âmbito estadual. A plataforma permitirá ainda uma apuração mais embasada da situação das diversas redes de ensino, auxiliando as atividades de fiscalização desta Corte de Contas por meio da produção de parâmetros de avaliação e do direcionamento eficiente de recursos humanos e materiais”, explicou Mariana Curi, responsável por esse subprojeto.

Ela lembra que as contribuições esperadas dizem respeito à possibilidade de identificação das redes de ensino mais e menos eficazes, assim como quais são os fatores associados a tal eficácia e o quanto impactam na proficiência dos alunos: escolares e extraescolares.

Anomalias nas despesas públicas

A terceira plataforma que está sendo criada diz respeito ao uso de IA para identificar anomalias nas despesas públicas. Esse subprojeto desenvolverá modelos para análise preditiva das despesas municipais e detecção de outliers (dados que se diferenciam drasticamente de todos os outros) em remuneração de servidores ou informações contábeis. O foco é disponibilizar para o Tribunal de Contas do Estado de São Paulo ferramentas e análises que aumentem a produtividade e a eficácia dos agentes de fiscalização, melhorando o controle e, consequentemente, a gestão dos recursos públicos.

Cuminato explicou que o convênio nasceu depois que um dos pesquisadores do CeMEAI, o professor Krerley Irraciel Martins Oliveira, da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), desenvolveu um sistema de detecção e correção de endereços para envio de cobranças do Tribunal de Justiça de Alagoas.

“Esse sistema evita que sejam encaminhadas correspondências judiciais para endereços inexistentes, economizando, assim, as despesas de envio e que não resultariam em notificação efetiva. Imaginamos que esse sistema poderia ser adaptado/readequado para potenciais necessidades do TCESP. Em contato com os técnicos do órgão, foram identificados outros problemas que poderíamos contribuir com soluções matemáticas e inteligentes e chegamos a esses três subprojetos inicialmente. Como enunciado nos objetivos do CeMEAI, procuramos transferir as tecnologias das ciências matemáticas para o setor produtivo ou instituições governamentais prestadoras de serviços, como é o caso do TCESP. O uso de inteligência artificial e processamento de linguagem natural nas áreas de ciências humanas é um fato concreto em várias aplicações. No caso do Tribunal, um sistema dessa natureza pode auxiliar os técnicos a detectar eventuais processos de compliance com desvios de conduta e que merecem maior atenção, bem como o estudo do desempenho das escolas do ensino público deve contribuir para a avaliação da efetividade de investimentos na melhoria do ensino praticado”, disse.

“O CeMEAI espera desenvolver sistemas de controle e avaliação para o órgão que venham a ser efetivamente utilizados pelos seus técnicos e que aumentem a efetividade da fiscalização do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo e, consequentemente, a visão dos resultados dos investimentos realizados pelos operadores do sistema”, concluiu Cuminato.