Solução desenvolvida por startup apoiada pelo PIPE-FAPESP promove o desenvolvimento e o alongamento de raiz e da parte aérea de plantas (imagem: divulgação/Insuma Biotecnologia)

Moléculas extraídas de microalgas aceleram a germinação de sementes

06 de agosto de 2024

Roseli Andrion  |  Pesquisa para Inovação – Mudanças de planos são parte do dia a dia. Quando isso ocorre em uma empresa, em geral é chamado de pivotar: assim, a companhia muda de direção ou propósito para, em outro segmento, alcançar sucesso e sustentabilidade. Foi exatamente isso que ocorreu com a startup Insuma Biotecnologia.

Quando Flávia Bottino iniciou a empresa, a bióloga tinha a intenção de responder ao questionamento de seus alunos e demonstrar, na prática, como aplicar a ciência em um negócio. Surgiu, então, a ideia de aplicar microalgas para separar o gás carbônico e o metano existentes no biogás — um biocombustível produzido a partir da decomposição de materiais orgânicos de origem vegetal ou animal.

Originalmente, o objetivo da pesquisadora era separar o metano do gás carbônico e usá-lo de forma mais eficiente. “O metano é um gás com grande potencial energético, mas acaba sendo utilizado para fins pouco nobres. Então, a proposta era utilizar as microalgas em uma biorrefinaria para separar esses dois componentes por meio de um processo biológico.”

A escolha não era aleatória: basta lembrar que o biogás tem relação direta com a mudança de matriz energética e a adoção de combustíveis renováveis, que são discutidas atualmente em todo o mundo. “Por ser uma cultura que fixa gás carbônico por meio de fotossíntese, tem relação direta com os debates sobre aquecimento global e mudanças climáticas.”

Um mês antes de começar o projeto de pesquisa, com apoio do programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE), da FAPESP, a pesquisadora participou de um programa de empreendedorismo mantido pela instituição: o PIPE Empreendedor. Foi aí que percebeu que a ideia, embora amplamente aceita pelo mercado, não era viável. “Verificamos que as companhias que separam os componentes do biogás já usam uma membrana para fazer esse processo”, conta Bottino. “Pensamos, então, em direcionar a solução para pequenas empresas, mas não existem aqui no Brasil gasodutos suficientes para elas escoarem o metano e o usarem posteriormente.”

Além disso, a pesquisadora conversou com a importadora da membrana para a separação de biogás. “Eles demonstraram interesse na tecnologia, mas apenas em longo prazo porque atualmente não têm gasoduto para lançar o biometano”, afirma. “O contato que fez a gente desistir dessa solução foi da Global Environment Facility (GEF) Biogás: eles deixaram claro que não há estrutura para isso no Brasil atualmente e a empresa não sobreviveria desse serviço.”

Projeto novo

O passo seguinte, então, foi usar as microalgas em testes para a extração de biomoléculas de interesse comercial. A equipe se concentrou na possibilidade de melhorar o cultivo de diferentes alimentos. “Uma dessas moléculas promove a germinação mais rápida de sementes: em três dias, ocorrem o desenvolvimento e o alongamento de raiz, bem como da parte aérea. Tudo isso é feito em meio inerte, de acordo com o preconizado pelo Ministério da Agricultura.”

A literatura sobre uso de microalgas no agronegócio é vasta, mas o desafio é a produção em escala. “Quando se aumenta a escala, o comportamento da molécula muda: não é como produzir em um tubo de ensaio. É preciso monitorar as variáveis que interferem ali, o que onera o sistema. No momento, estamos justamente buscando otimizar o processo de obtenção das moléculas para barateá-lo.”

Os testes iniciais foram feitos com milho, alface e pimentão. “O pimentão tem um apelo aqui na região e é muito difícil de cultivar, porque a semente é sensível e desenvolve fungos muito facilmente”, diz Bottino. “Ele não se desenvolve bem como as outras, mas mesmo assim ele teve desenvolvimento bem interessante com o uso das microalgas.”

Os pesquisadores já conseguiram aclimatar as microalgas em um meio de cultura alternativo. “As cepas de microalgas que usamos são versáteis e se adaptam bem.” A solução da startup não adiciona produtos químicos à cultura. “Adicionamos nutrientes, principalmente nitrogênio e fósforo, e a microalga, para crescer nesse meio, retira esses químicos dali e os armazena. Quando isolamos essa molécula, ela já secretou hormônios, aminoácidos e outras moléculas que impulsionam o crescimento das hortaliças.”

O objetivo da empresa é atender pequenos produtores. “Especialmente os que cultivam hortaliças, porque os resultados dos testes foram bem animadores”, detalha a pesquisadora. “Buscamos principalmente o segmento de orgânicos. Eles certamente vão ter ganho financeiro, porque há um desenvolvimento muito bom da raiz e a planta ganha força para crescer melhor.”

Paralelamente, a startup tem sido procurada para testar a solução na germinação in vitro de outras cultivares. “Eles querem usar esse metabólito que isolamos para promover o crescimento mais rápido e efetivo antes de levar para o campo.” Além disso, a empresa quer criar um banco de microalgas que garantam perfis bioquímicos diferentes. Assim, será possível isolar moléculas distintas e ter outros produtos.

Mais incentivos

O projeto de extração de biomoléculas em geral foi aceito, ainda, em um programa de fomento a startups da Prefeitura de Araraquara. “Fomos aprovados em primeiro lugar e passamos a receber esses recursos para custear serviços. É um incentivo que ajuda nos custos de material de consumo do laboratório.”

Os pesquisadores já realizaram um experimento de germinação em vasos. “As plantas estão crescendo muito bem. Além disso, como não há formulação química, a solução é sustentável e tem afinidade com a agricultura regenerativa.”

O sistema já está em fase de teste em campo. O próximo passo é ter a estrutura laboratorial necessária para permitir o crescimento do microrganismo, otimizar o cultivo e produzir em escala. “Hoje, eu talvez conseguisse atender uma cooperativa com cerca de 50 produtores. Com um laboratório estruturado, em dois ou três anos, eu estaria preparada para atender toda a macrorregião de Araraquara. No futuro, em aproximadamente cinco anos, a ideia é atender todo o Cinturão Verde.”