Plataforma, desenvolvida com apoio do PIPE-FAPESP, usa um protocolo clínico conhecido como Terapia Cognitivo-Comportamental; tecnologia foi apresentada em missão empresarial durante a FAPESP Week Itália (imagem: divulgação Sleep UP)

Aplicativo usa inteligência artificial para monitorar o sono e combater a insônia

15 de outubro de 2024

Roseli Andrion  |  Pesquisa para Inovação – Um dos principais momentos do dia é o sono. É nesse período que ocorrem as principais funções de renovação do organismo, como a reparação de tecidos, a recuperação muscular, a restauração do sistema imunológico, a produção hormonal e a consolidação de memórias, entre outros. Por esse motivo, a privação de sono afeta os sistemas imunológico, digestivo e endócrino, além de ser associada a disfunções cardíacas e diabetes, explica Renata Bonaldi, fundadora da startup SleepUp.

“No curto prazo, os insones vão ter sonolência, cansaço e mau humor, por exemplo. Quando se melhora a qualidade do sono, com o auxílio da psicoterapia, por outro lado, passa-se a ter uma experiência mais restauradora e saudável”, afirma a pesquisadora.

Para auxiliar esses pacientes, a startup desenvolveu, com apoio do Programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE), um aplicativo médico contra a insônia. A plataforma usa um protocolo clínico conhecido como Terapia Cognitivo-comportamental para a insônia. “Em geral, os medicamentos não tratam a causa da insônia — que é comportamental e cognitiva. Eles se limitam a amenizar os sintomas”, diz Bonaldi.

A startup foi uma das selecionadas para participar de uma missão empresarial na FAPESP Week Itália, que começou ontem (14/10) e termina hoje (15/10) na Universidade de Bolonha.

Segundo a pesquisadora, a maioria das causas de insônia envolve comportamentos que prejudicam o horário de dormir. Com o aplicativo, elas são tratadas por meio de terapia — que é o padrão-ouro para o tratamento dessa condição. “Em algumas semanas, já há melhora, mas a correção completa depende da causa. Nosso protocolo leva pelo menos três meses para ser concluído.”

A abordagem digital proposta pela solução atua nos motivos que levam à enfermidade. Além disso, o app inclui outros recursos, como anamnese e diários. “O objetivo é democratizar o acesso à saúde do sono. É uma necessidade bastante recorrente, já que esse problema atinge aproximadamente metade da população global.”

A pesquisadora passou a estudar o tema após conversas com potenciais usuários da plataforma enquanto estudava o uso de tecnologias na saúde. “O sono apareceu em primeiro lugar nas minhas pesquisas. As pessoas querem ajuda porque não têm acesso fácil a diagnósticos e tratamentos nessa área. Como elas buscam uma intervenção tecnológica para distúrbios do sono, criamos essa opção de tratamento digital.”

Os usuários da ferramenta percorrem uma jornada de atividades diariamente para garantir que o sono seja mais saudável. “Trata-se de um conjunto de estratégias embasadas na psicoterapia. O paciente segue as tarefas até melhorar da condição”, explica Bonaldi. “Além disso, ele pode acompanhar as métricas do próprio sono por gráficos.”

Apneia é fisiológica

A apneia, por sua vez, tem causas fisiológicas. No Brasil, afeta cerca de 30% da população, segundo dados do Instituto do Sono. Muitos doentes não buscam diagnóstico nem tratamento para a condição — muitas vezes até por ignorarem as opções e as possibilidades. “Nosso app pode ajudar nesse sentido”, avalia Bonaldi.

É comum que o paciente com apneia moderada ou grave precise usar um dispositivo para manter o fluxo de ar nas vias aéreas (Continuous Positive Airway Pressure – CPAP) durante o sono. “Como a apneia normalmente não tem cura, o uso do equipamento é vitalício. Nesse caso, o app da SleepUp auxilia na adesão ao tratamento, já que há a terapia e o monitoramento via aplicativo.”

Tanto para insônia quanto para apneia, o sistema pode, ainda, ser associado a dispositivos vestíveis (uma faixa para a cabeça que coleta dados de eletroencefalograma e um anel que obtém informações de oximetria) para o diagnóstico de patologias. “Esses acessórios têm tecnologia proprietária e seu uso é indicado por profissional de saúde. O paciente leva para casa e dorme com eles. O médico, então, tem acesso a dados clínicos precisos das características do sono daquele indivíduo e define uma estratégia de tratamento a partir dessas informações.”

A atuação do especialista é fundamental para que os resultados sejam interpretados corretamente. “Se o paciente não entende o significado dos dados, isso pode causar até preocupação extra e ansiedade”, avalia Bonaldi. “O sono é uma função orgânica, e quanto menos o indivíduo se preocupar com ele, melhor. Com o envolvimento do profissional de saúde, o paciente vai saber o que é natural e o que não é.”

25 mil usuários

O aplicativo tem validação clínica e aprovação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). “É uma terapia digital para tratamento de uma doença crônica e temos evidências de eficácia do protocolo.” Com mais de 25 mil usuários e 18 publicações acadêmicas, o app está disponível em todas as lojas de aplicativos e a empresa oferece uma versão gratuita. O uso é liberado para interessados com mais de 18 anos.

Com versões em espanhol e em inglês, o produto vai ser submetido à aprovação das agências reguladoras dos Estados Unidos e da Europa. “Ele já está disponível em Abu Dhabi, a capital dos Emirados Árabes Unidos. Temos intenção de ser uma empresa global. O nome da empresa, em inglês, já foi pensado com esse objetivo.”

Segundo Bonaldi, o sistema não tem concorrentes no Brasil, uma vez que é a única opção nacional já aprovada pela Anvisa. “Aqui no Brasil, ainda não tem ninguém que faça essa intervenção de tratamento e diagnóstico ao mesmo tempo. Tem quem faça só diagnóstico, tem quem se dedique apenas a tratamento, mas da forma como fazemos e com aprovação da Anvisa, somos os únicos”, compara.

Os algoritmos do app foram desenvolvidos com inteligência artificial. “Além de ser tudo proprietário, foi completamente desenvolvido no Brasil. A inteligência artificial é aplicada na automação, na personalização e no treinamento dos algoritmos de monitoramento do eletroencefalograma vestível.”