Spray neutraliza o novo coronavírus por três dias

10 de novembro de 2020

* Pesquisadores do Laboratório de Engenharia e Química de Produtos (Lequip) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) desenvolveram um spray para recobrir máscaras e outros equipamentos de proteção individual (EPIs) capaz de formar uma capa protetora ativa e de ação prolongada que neutraliza o coronavírus por contato.

Batizado de SprayCov, o produto eliminou o SARS-CoV-2 depois de apenas um minuto e manteve 99,99% de eficácia nas 48 horas seguintes. “Nossa fórmula não é um agente sanitizante como o álcool 70 ou o hipoclorito de sódio que usamos na limpeza. É um processo para tornar a máscara capaz de inativar o vírus”, explica Marisa Masumi Beppu, professora da Faculdade de Engenharia Química da Unicamp e fundadora do Lequip.

A pesquisadora realiza um projeto, apoiado pela FAPESP, com o objetivo de desenvolver materiais bioativos à base de proteínas e polímeros visando aplicações de interesse biomédico.

O spray é indicado para aplicação em EPIs usados por profissionais de saúde, mas também pode ser aspergido em máscaras de algodão. A ideia é que a solução confira uma barreira ativa que destrua o vírus assim que ele tiver contato com a superfície recoberta. Atualmente, os equipamentos de proteção individual servem mais como barreira física.

Uma das preocupações dos pesquisadores foi a escolha criteriosa das substâncias – sais de cobre –, pensando nos impactos do uso prolongado do spray no meio ambiente.

Os sais de cobre já são usados em larga escala na agricultura, há mais de um século, como fungicida para conter o avanço de pragas. “O impacto ambiental não seria diferente de um agricultor usando a calda bordalesa na plantação”, compara Beppu.

A tecnologia também usa uma mistura de polímeros biodegradáveis que funcionam como uma espécie de cola para a fixação dos sais. A aderência foi testada em diversas superfícies, alcançando os mesmos resultados em tecidos e não tecidos. Com os resultados promissores, a Agência de Inovação Inova Unicamp fez o depósito do pedido de patente junto ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) e está promovendo a oferta ativa da tecnologia a empresas com potencial para licenciar a tecnologia e levá-la ao mercado.

“Recentemente, fomos procurados por representantes de empresas têxteis e também do setor público”, diz Beppu.

Outra vantagem da fórmula está no preço dos insumos. O custo de recobrimento de máscaras com o SprayCov foi calculado pelos pesquisadores em pouco menos de R$ 0,02 por máscara. “O cobre é tão eficaz quanto a prata”, afirma Clarice Weis Arns, professora do Instituto de Biologia da Unicamp e responsável pelos testes.

As análises de eficácia foram realizadas no Laboratório de Virologia Animal (LVA), da Unicamp, que já avaliou a ação virucida de outros produtos apresentados pela força-tarefa da universidade, montada no início do ano contra a COVID-19.

Amostras do vírus SARS-CoV-2 e de um modelo dele, chamado de MHV – outro tipo de coronavírus, mais resistente e que afeta apenas camundongos –, foram colocadas em contato com a fórmula e células vivas in vitro. O SprayCov não apresentou toxicidade para as células, inibiu a replicação do coronavírus por três dias e ainda reduziu a capacidade de inoculação, desarticulando os mecanismos que permitem a instalação da doença.

O recobrimento libera íons que atacam o vírus. Essas partículas eletricamente carregadas causariam rupturas, decompondo e destruindo o envelope que reveste o microrganismo. “Nessa camada mais externa, composta de glicoproteínas, ficam todas as informações genéticas que permitem ao coronavírus entrar em nossas células. Uma vez desfeita, o vírus deixa de existir e não consegue mais infectar o hospedeiro”, explica Arns.

Para a virologista, a tecnologia não só é viável como abre outras possibilidades para o campo da pesquisa. “Ao aplicar o produto muito próximo das vias aéreas superiores, se tiver algum vírus preso nos cílios, no nariz ou na garganta o recobrimento da máscara pode ajudar a eliminar”, avalia.

Os pesquisadores acreditam que o invento possa ainda ser eficaz contra outros tipos de vírus causadores de doenças respiratórias, como a influenza provocada pelo H1N1. Novos estudos, em andamento, buscam elucidar como os íons de cobre e, possivelmente, também alguns contraíons que equilibram o componente agem na batalha para destruir esses microrganismos.

*Com informações da Agência de Inovação Inova, da Unicamp.