Sistema foi testado com a velocidade de 25 atualizações por segundo e pode manter este desempenho no rastreamento de mais de 100 objetos simultaneamente (foto: Kartfly)

Banda ultralarga é utilizada para localizar veículos em ambientes fechados

09 de janeiro de 2018

Suzel Tunes  |  Pesquisa para Inovação - A KartFly, empresa de entretenimento localizada em Campinas, está desenvolvendo uma nova tecnologia para a localização precisa e imediata de veículos em ambientes fechados. O sistema já é utilizado em pistas de corrida de karts elétricos, a especialidade da empresa. Mas os sócios da KartFly – os engenheiros Fellipe Saldanha Garcia, Guilherme Mariottini Alves e Caê Castelli – vislumbram aplicações adicionais à tecnologia, como a localização de veículos e equipamentos dentro de plantas industriais.

O projeto foi desenvolvido com apoio do Programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE) e encerrou a Fase 1, de demonstração da viabilidade tecnológica, em maio de 2017. Segundo Fellipe Saldanha, pesquisador responsável pelo projeto, foi possível, inclusive, chegar a um protótipo com resultados considerados promissores. “Conseguimos chegar a uma precisão de 40 centímetros nessa primeira fase, mas a meta é atingir os 20 centímetros”, afirma.

Ele explica que o GPS (Global Positioning System), um dos sistemas de localização mais utilizados para veículos, que utiliza sinais de satélite, só é realmente eficaz em ambientes abertos e, mesmo assim, com precisão de cerca de 2 metros – o que pode ser suficiente para o motorista identificar a rua em que está, mas é ineficaz para identificar a localização de um veículo dentro de uma pista de kart ou um galpão industrial.

Os pesquisadores da KartFly optaram pelo uso da tecnologia conhecida como UWB (Ultra Wide Band) ou “Banda Ultralarga”, que usa sinais de rádio e é capaz de obter maior precisão em ambientes fechados, dependendo do algoritmo desenvolvido. Esse, aliás, foi o grande desafio da pesquisa: criar um modelo matemático para o cálculo da localização a partir do envio de sinais de rádio, que se propagam à velocidade da luz.

“Os karts possuem sensores que recebem sinais de rádio emitidos a partir de pontos fixos de referência espalhados pela pista. A partir da diferença de tempo em que o sinal se propagou, é possível calcular a distância do kart em relação à antena e, consequentemente, sua localização na pista”, diz Fellipe Saldanha.

No entanto, o uso do sinal de rádio não é apenas uma vantagem, mas, também, um problema a ser solucionado. “Os sinais de rádio propagam-se à velocidade de cerca de 300 mil km/s. Os relógios convencionais não conseguem medi-lo com exatidão, cabendo ao sistema matemático a tarefa de anular as imprecisões para obter a localização correta”, explica o pesquisador. Segundo Saldanha, o mercado já oferece sistemas de localização indoor com precisão de 20 centímetros, mas não com a velocidade em que correm os karts elétricos. “Na pesquisa que fizemos sobre sistemas de localização em ambientes fechados, todos os sistemas encontrados são para localização lenta de objetos, atualizando até cinco vezes por segundo quando mais de um objeto é rastreado. Já o sistema da KartFly foi testado com a velocidade de 25 atualizações por segundo, sendo que pode manter este desempenho com mais de 100 objetos rastreados simultaneamente. O sistema de localização foi projetado inicialmente para a velocidade dos karts (70km/h), podendo ser aprimorado para velocidades de até 300km/h.”

Videogame na vida real

Identificar com precisão de centímetros a posição em que cada kart circula em uma pista de corrida tem um propósito bem determinado no modelo de negócios da KartFly. A empresa pretende oferecer uma nova modalidade de corrida que reproduza, na vida real, algumas funcionalidades do videogame. “Será possível instalar na pista alguns sensores que alterem a velocidade do carro no momento exato em que ele passar pelo local. Assim, por exemplo, ao passar por um ponto da pista marcado com o adesivo ‘turbo’, ele terá a velocidade aumentada em alguns segundos, ou ao passar pela ‘lama’, terá a velocidade diminuída”, explica Guilherme Mariottini Alves, sócio responsável pela área administrativa da empresa.

Alves explica que o propósito inicial da empresa era criar uma experiência interativa em corridas de kart e ampliar as perspectivas do negócio. Inicialmente, a ideia era utilizar o sistema em pista própria e, numa segunda fase, expandir a empresa a partir de franquias e do licenciamento da tecnologia no mercado de entretenimento. Contudo, a participação da empresa no 2º Treinamento PIPE em Empreendedorismo de Alta Tecnologia (programa de capacitação de sete semanas que teve encerramento em dezembro de 2016) ampliou as perspectivas dos sócios da KartFly. Agora, para além do mercado de entretenimento, eles buscam parceiros no setor de logística. “A ideia é criar um novo modelo de negócio, sem excluir o antigo”, diz Guilherme Mariottini. Em futuro próximo, prevê o engenheiro, a tecnologia poderá ser aplicada amplamente em veículos autoguiados.

Adrenalina sem poluição

O próximo passo da empresa é estabelecer parcerias comerciais antes de aprimorar a tecnologia, pela qual pretendem expandir a empresa. Atualmente, a KartFly está consolidada no mercado de entretenimento: é dona de uma pista de kart elétrico na América Latina e produz seus próprios veículos, a partir de conhecimentos adquiridos nas pesquisas sobre baterias que Fellipe Saldanha vem realizando desde o mestrado em Engenharia Elétrica pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), entre 2008 e 2010.

Em 2012, Fellipe Saldanha uniu-se a Guilherme Mariottini e Caê Castelli, ambos engenheiros químicos formados pela Unicamp, para a participação do “Desafio Unicamp de Inovação Tecnológica”, competição de modelo de negócios idealizada pela Agência de Inovação Inova Unicamp. Os três (que logo se tornariam sócios) desenvolveram, juntamente com a engenheira de alimentos Marina Sodini, um modelo de negócios baseado em um sistema híbrido de armazenamento de energia elétrica, tema da pesquisa que Fellipe Saldanha havia desenvolvido em 2011, com o apoio do Programa PIPE. À época, Saldanha tinha uma empresa incubada na Unicamp, a Ekion Tecnologia de Veículos Elétricos.

O primeiro kart elétrico surgiu quase como uma brincadeira dos três amigos: “decidimos montar um kart com baterias que usávamos na produção de bicicletas elétricas”, lembra Saldanha. Nascia aí a KartFly, em 2013, disposta a inovar nesse ramo de entretenimento, oferecendo veículos que não emitem gases poluentes nem altos ruídos. Segundo Guilherme Mariottini, nos Estados Unidos já existem cerca de 100 pistas de karts elétricos e, na Europa, cerca de 150. A primeira pista brasileira foi instalada pela KartFly em 2014, em um shopping de Campinas.

Atualmente, Fellipe Saldanha está na Inglaterra e acompanha a empresa a distância. Recebeu convite para atuar na área de Pesquisa e Desenvolvimento de uma empresa de eletrônica. Ainda na condição de sócio, atua como consultor. O engenheiro eletricista Marcos Ferretti é o pesquisador principal. E enquanto buscam a aplicação do sistema de localização em novos negócios, os sócios da empresa continuam investindo no kart: “Estamos fazendo agora karts menores e de menor velocidade, que gastam menos energia e requerem menor investimento. Esses são voltados especialmente ao público infanto-juvenil. Com a possibilidade da localização indoor e da interatividade, esse será nosso principal público”, antevê o pesquisador.

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